06.01.2020 – Com a vigência da Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD, um questionamento frequente é feito no sentido de indagar-se se empresas de cobrança contratadas por instituições financeiras, redes varejistas ou outras organizações credoras, podem continuar ligando para indivíduos, supostamente utilizando-se de seus dados pessoais compartilhados pelas empresas contratantes do serviço e, portanto, credoras do montante vindicado, ou não.

A resposta é relativamente simples, sob a ótica da LGPD. Embora a LGPD seja muito semelhante ao texto da GDPR (lei de proteção de dados europeia), houve pressões políticas consideráveis no Brasil, para incluir a “proteção do crédito” como uma das bases legais para justificar o tratamento de dados pessoais, no texto da lei, a despeito de haver consentimento ou não por parte do titular de tais dados. Com isso as bases legais da LGPD alcançaram um total de 10 (dez) bases legais, contra apenas 6 (seis) bases legais da GDPR. Se o leitor desejar aprofundar-se no tema, basta, acessar o artigo “As bases legais da LGPD x as bases legais da GDPR“, que compara as bases legais dos 2 (dois) textos).

Embora a empresa de cobrança, sob a ótica da LGPD, possa perseguir a proteção do crédito do credor, pelo qual fora contratada e mediante contrato, com cláusulas específicas, recebera dados pessoais de terceiros em débito, alguns tipos de cobrança devem merecer maior atenção por parte das empresas contratantes de tais serviços, devido a práticas, no mínimo, questionáveis, para lograr êxito, podendo trazer riscos que podem alcançar as empresas contratantes, se os contratos não tiverem delimitado muito bem o alcance da responsabilidade dos métodos utilizados pelas empresas de cobrança, inclusive, com cláusulas indenizatórias, em caso de condenação judicial solidária ou subsidiária, alcançando a empresa contratante.

Exemplos comezinhos de falhas ou práticas questionáveis cometidas por empresas de cobrança podem ser encontradas abaixo:

1. Ligações insistentes para um número telefônico de um suposto devedor, sendo que tal número já foi transferido pela operadora de telefonia para o nome de outra pessoa sem qualquer vínculo com o mesmo;
2. Utilização de robôs e dezenas de linhas telefônicas diretas para acessar o devedor, em diferentes horários, inclusive horários no início da manhã, noturnos ou em fins de semana;
3. Adoção de práticas intimidatórias, sem dar ao devedor qualquer chance de argumentação. Em inúmeros casos, as dívidas são feitas por golpistas e não pelo suposto devedor;
4. Inclusão do nome do devedor em um banco de proteção ao crédito, sem verificação preliminar do nexo causal entre o devedor e a suposta dívida; etc..

Em 04 de janeiro de 2021, a CNN Brasil noticiou que uma empresa que ligou mais de 80 vezes para cobrar uma dívida, foi condenada a se abster de fazer qualquer contato com o titular da linha telefônica, além de ser obrigada a indenizá-lo em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), conforme manutenção da sentença por parte do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, visto que tal cobrança não era endereçada ao real devedor, tendo o referido titular da linha tentado informar o fato à empresa, que simplesmente desconsiderou o aviso.

E é exatamente nesse ponto de vulnerabilidade que voltamos nossa atenção à LGPD. Se a cobrança está feita a um indivíduo distinto do real devedor, cabe a esse indivíduo, vítima da cobrança indevida, arguir a violação à LGPD, pelo tratamento indevido dos seus dados pessoais, podendo requerer a adoção das sanções previstas no Art. 52 da LGPD, que vão desde advertência, passando pela multa de até 2% do faturamento da pessoa jurídica limitada a R$ 50 (cinquenta) milhões, além de outras sanções desde a eliminação dos dados, chegando até mesmo à proibição da atividade.

Portanto, ainda que no Brasil, a ótica do dano moral seja compensatória, ao invés de punitiva e as indenizações sejam pífias, sob o vil argumento do locupletamento ilícito, equívocos nas cobranças podem suscitar penalidades com impacto financeiro considerável, sob a ótica da LGPD.

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