28.08.2020 – O que tem ocorrido com a tramitação da Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD no Brasil é algo que nem mesmo os autores de novela poderiam imaginar.

Quando a Lei 13.709/2018, ou seja, a LGPD foi sancionada em 14 de agosto de 2018 e publicada no Diário Oficial da União em 15 de agosto de 2018, seu texto original dizia que a mesma entraria em vigor após decorridos 18 (dezoito) meses de sua publicação oficial.

Todavia, sobreveio a Medida Provisória 869/2018, que acabou convertida na Lei 13.853/2019 e alterou a vigência da LGPD da seguinte forma:

  1. No dia 28 de dezembro de 2019 para os Arts. 55-A, 55-B, 55-C, 55-D, 55-E, 55-F, 55-G, 55-H, 55-I, 55-J, 55-K, 55-L, 58-A e 58-B (todos eles sobre a Agência Nacional de Proteção de Dados – ANPD e o Conselho Nacional de Proteção de Dados – CNPD).
  2. 24 (vinte e quatro) meses após a data de sua publicação para os demais arquivos.

Em razão especialmente de atraso na estruturação da ANPD e sob argumento de que as empresas precisariam de mais tempo para se adaptar à lei, o Governo Brasileiro editou a Medida Provisória 959 em 29 de abril de 2020, especialmente sobre regras para o benefício emergencial em razão da pandemia causada pelo coronavírus e aproveitou para inserir o parágrafo quarto, estendendo o prazo de vigência da LGPD de 24 (meses) após a data de sua publicação, para 03 de maio de 2021.

Todavia, qualquer medida provisória é válida pelo prazo de 60 dias, podendo ser prorrogada por mais 60 dias, devendo nesse intervalo ser convertida em lei.

Porém, de forma inesperada para muitos, o Congresso Nacional aprovou a Lei 14.010 em 10 de junho de 2020, que dispunha sobre o regime jurídico emergencial e transitório das relações jurídicas de direito privado, em razão da pandemia, mas que acabava incluindo um artigo, postergando a vigência dos Arts. 52, 53 e 54 (sanções administrativas) para 1º de agosto de 2021.

Até aquele momento, já tínhamos 2 certezas:

  1. Arts. 55-A, 55-B, 55-C, 55-D, 55-E, 55-F, 55-G, 55-H, 55-I, 55-J, 55-K, 55-L, 58-A e 58-B (todos eles sobre a Agência Nacional de Proteção de Dados – ANPD e o Conselho Nacional de Proteção de Dados – CNPD) – vigentes a partir de 28 de dezembro de 2019.
  2. Arts. 52, 53 e 54 (sanções administrativas) – vigentes a partir de 1º de agosto de 2021.

E o restante da LGPD? Certamente, dependeria do que iria acontecer com a Medida Provisória 959/2020, sobre a qual incidiram quase 30 emendas, com diferentes proposições apenas para a data de vigência da LGPD. Na qualidade de casa iniciadora, em 25 de agosto de 2020, a Câmara dos Deputados aprovou a conversão da medida provisória em lei e a vigência da LGPD para 1º de janeiro de 2021.

Terminada a novela? De modo algum… Faltava ainda o turno de votação na casa revisora, ou seja, o Senado Federal. Para surpresa geral da Nação, o Senado Federal, em 26 de agosto de 2020, aprovou a conversão da medida provisória em lei, mas excluiu o Art. 4º, que tratava do adiamento da vigência da LGPD para 1º de janeiro de 2021.

Qualquer legal ordinária precisa passar pela sanção presidencial, cabendo ao presidente sancioná-la ou vetá-la, ainda que parcialmente. E agora? Para responder essa pergunta, precisamos revisitar 2 leis.

Se o Art. 4º que prorrogaria a vigência da LGPD foi excluído, significa dizer que voltaria o seu prazo de 24 meses, atribuído pela Lei 13.853/2019, contado desde a publicação. Sendo assim, precisaríamos consultar o Art. 8º, § 1º da Lei Complementar 95 de 26 de fevereiro de 1998, que diz o seguinte:

Art. 8o A vigência da lei será indicada de forma expressa e de modo a contemplar prazo razoável para que dela se tenha amplo conhecimento, reservada a cláusula “entra em vigor na data de sua publicação” para as leis de pequena repercussão.

§ 1o A contagem do prazo para entrada em vigor das leis que estabeleçam período de vacância far-se-á com a inclusão da data da publicação e do último dia do prazo, entrando em vigor no dia subseqüente à sua consumação integral.

Sendo assim, como a LGPD foi publicada em 15 de agosto de 2018, a mesma entraria em vigor em 16 de agosto de 2020!!! Está resolvido o problema? Ledo engano…

Precisamos recorrer à segunda lei, que é nada mais, nada menos que a lei maior do Brasil, ou seja, sua Constituição Federal, mais especificamente em seu Art. 62, § 12, que diz o seguinte:

§ 12 – Aprovado projeto de lei de conversão alterando o texto original da medida provisória, esta manter-se-á integralmente em vigor até que seja sancionado ou vetado o projeto.

Dessa forma, ainda que o Art. 4º da medida provisória convertida em lei, tenha sido retirado pelo Senado Federal, seus efeitos permanecem em vigor até a sanção ou o veto presidencial. Assim, ainda que a LGPD devesse entrar em vigor em 16 de agosto de 2020, ao restaurar-se o prazo atribuído pela Medida Provisória 13.853/2019; com esse dispositivo constitucional, pode-se dizer que ela entra em vigor na data da sanção ou veto presidencial; o que não ocorreu até a presente data deste artigo… embora haja juristas defendendo que, em razão da subtração do Art 4º da medida provisória convertida em lei, a LGPD está em vigor desde 16 de agosto de 2020.

Certamente, esse é um caso para apreciação do próprio Congresso Nacional que precisa definir uma regulamentação mais precisa, seja em sede de normas constitucionais ou mesmo infra-constitucionais.

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