24.03.2020 – Segundo a SEC (Securities & Exchange Commission) – Comissão de Valores Mobiliários norte-americana, em abril de 2010, a Daimler utilizou-se de subornos para aumentar as suas vendas a governos de 22 países, dentre eles, Rússia, China, Vietnã, Nigéria e Hungria, por mais de 10 anos.

Na verdade, a Daimler usou dezenas de contas contábeis, conhecidas internamente como “interne Fremdkonten” ou “contas internas de terceiros”, para manter saldos de créditos em benefício de funcionários públicos estrangeiros desses respectivos países. Tais créditos eram administrados pela Daimler e, por vezes, revendedores e distribuidores estrangeiros eram usados como intermediários para efetuar pagamentos a funcionários públicos estrangeiros.

É interessante salientar que as contas eram “mantidas” sob nomenclaturas disfarçadas de “sobretaxas de preços”, “inclusões de preços” ou “comissões excessivas”.

A Daimler também utilizou descontos ou abatimentos artificiais em contratos de vendas, para concretizar subornos; sendo que parte ou a totalidade do desconto era encaminhado a funcionários públicos estrangeiros por outros subterfúgios.

Além disso, foi identificado que executivos da área de vendas receberam somas da ordem de milhares de dólares e que tais valores eram repassados a funcionários públicos estrangeiros, permitindo à Daimler ocultar o real objetivo e os destinatários de tais somas.

O mais impressionante, segundo a SEC, é que tais práticas foram sancionadas por membros da administração da Daimler, incluindo gerentes gerais locais e ex-chefes dos departamentos de vendas e veículos no exterior e, por incrível que pareça, continuaram mesmo quando a SEC já havia iniciado a investigação.

A Daimler violou:

  1. a Seção 30A do Securities Exchange Act norte-americano, de 1934, efetuando pagamentos ilícitos a funcionários públicos estrangeiros, a fim de obter ou manter negócios,
  2. a Seção 13 (b) (2) (B) do Exchange Act por não ter controles internos adequados para detectar e impedir os pagamentos, e
  3. a Seção 13 (b) (2) (A) do Exchange Act por registrar indevidamente os pagamentos em seus livros e registros.

Sem admitir ou não a culpa, a Daimler acordou um termo de ajuste de conduta, que dentre outras exigências a serem cumpridas durante 3 anos, implicou na obrigação da Daimler em pagar USD$ 91,4 milhões para liquidar as acusações da SEC e pagar USD$ 93,6 milhões em multas para liquidar acusações em processos criminais separados, liderado pelo Departamento de Justiça dos EUA – US DOJ. Além disso a Daimler teve que reter um consultor independente durante esse tempo.

Importante finalizar, esclarecendo que a Daimler fez o seu dever de casa e cumpriu com todas as exigências previstas no termo de ajuste de conduta. E, certamente, seu programa de compliance atual é bem mais robusto que o da época.

LIÇÕES APRENDIDAS:

  1. Quando falamos em Daimler, estamos falando de Mercedes-Benz, uma das marcas mais famosas e respeitadas do mundo!!! Tal caso demonstra que nenhuma empresa, por melhor reputação que tenha, está livre de se ver seriamente afetada ou até arruinada pela má-conduta de algum colaborador ou alguns colaboradores.
  2. Não espere encontrar contas contábeis com a nomenclatura “fraude”. Obviamente, contas contábeis que acobertam subornos ou fraudes, tem nomenclaturas distintas. Portanto, desconfie de contas com definição imprecisa. Aliás, ouvi de um auditor em Boston, Massachussets, em 2014, algo que nunca mais esqueci: O auditor vai onde vai o dinheiro! Portanto, siga o dinheiro…
  3. Descontos… muito cuidado com descontos. Mesmo quem utiliza descontos de forma ética e legal, deve fazê-lo dentro de uma regra pré-estabelecida dentro da organização (que pode ser uma política comercial, por exemplo) e deve sempre procurar dar total transparência ao porquê do desconto. Descontos são uma forma frequente de repasse de suborno para autoridades e terceiros da iniciativa privada.
  4. Se a empresa estiver envolvida em algum ato de corrupção que vem à tona e imediatamente se inicia uma investigação, a alta gerência da empresa tem a obrigação de se certificar que tal prática cesse de imediato e, obviamente, fazer com que a empresa colabore com as autoridades. Potenciais omissões ou inércias da alta gerência vão pesar sobremaneira no valor da condenação e nos seus respectivos empregos.
  5. Em situações como essa, é mandatório rever todo o programa de compliance, assim como também a área de controles internos, ligada à Finanças, pois algo falhou. O programa de compliance precisa ter como finalidade a eficiência, ou seja, a criação de uma cultura de integridade que possa ser compreendida por cada colaborador como a única forma de fazer negócio. Integridade, definitivamente, não é negociável…
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