31.03.2020 – A francesa Airbus e a norte-americana Boeing têm travado uma competição digna de aplausos, duelando pelo mercado global de aviação comercial, com tecnologia cada vez mais sofisticada, em superação de lado a lado.

Em março de 2019, a rival Boeing começou a viver o seu inferno astral com a queda do seu segundo jato, modelo 737 Max. Os acidentes foram causados por uma falha de projeto no sistema MCAS (Maneuvering Characteristics Augmentation System), ou sistema de ampliação de característica de manobra, tornando o avião ingovernável nos dois acidentes que causaram a morte de 346 pessoas na Etiópia e na Indonésia.

Porém, a Airbus também estaria prestes a viver um pesadelo.

Na verdade, a Airbus concordou em pagar multas de € 3.598 milhões, mais juros e custos às autoridades francesas, inglesas e norte-americanas. Os acordos com cada uma das autoridades ocorreram da seguinte forma: França: PNF (Parquet National Financier) – € 2.083 milhões, Reino Unido: SFO (Serious Fraud Office) – € 984 milhões e EUA: DOJ (Department of Justice) – € 526 milhões e DoS (Department of State) – € 9 milhões, dos quais
4,50 milhões de euros puderam ser utilizados para medidas corretivas aprovadas de compliance.

Tais acordos tiveram o propósito de resolver acusações de suborno estrangeiro com autoridades nos Estados Unidos, França e Reino Unido, decorrentes de um esquema, no qual a empresa usava parceiros comerciais para subornar funcionários públicos, bem como executivos de companhias aéreas não governamentais, em todo o mundo, além de ter violado a Lei de Controle de Exportação de Armas (AECA) norte-americana e o Regulamento Internacional de Tráfico de Armas (ITAR). Este foi considerado o maior acordo global de resolução, relacionado a suborno estrangeiro, até o momento.

Para tanto, A Airbus firmou um termo de ajuste de conduta (DPA – deferred prosecution agreement) com o Departamento de Justiça norte-americano, em 28 de janeiro de 2020 no Distrito de Columbia, acusando a Companhia de conspiração por violar a disposição antissuborno da Lei de Práticas de Corrupção no Exterior (FCPA) e firmou, também, um termo de consentimento (Consent Agreement), sob a acusação de conspiração para violar a AECA e a ITAR. A cobrança por violação da FCPA (Foreign Corrupt Practices Act – Lei norte-americana de práticas de corrupção no estrangeiro) surgiu do esquema da Airbus de oferecer e pagar subornos a autoridades estrangeiras, incluindo autoridades na China, Malásia, Sri Lanka, Indonesia, Taiwan e Ghana, entre 2011 e 2015, a fim de obter e manter negócios, incluindo contratos de venda de aeronaves. A acusação de violação da AECA decorre da falha voluntária da Airbus em divulgar contribuições políticas, comissões ou taxas ao governo dos EUA, conforme exigido pelo ITAR, em conexão com a venda ou exportação de artigos de defesa e serviços de defesa para as Forças Armadas de um país estrangeiro ou internacional organização.

Além disso, a Airbus firmou outro termo de ajuste de conduta (DPA – deferred prosecution agreement) com o Serious Fraud Office britânico e também uma Convention Judiciaire d’Intérêt Public com o Parquet National Financier francês, pelos atos de corrupção no estrangeiro.

Em razão dos 3 documentos, a Airbus terá que cumprir diversas exigências pelo prazo de 3 anos, com as autoridades dos 3 países, incluindo a necessidade de submeter o seu programa de compliance a auditores da Agência Francesa Anticorrupção (AFA); razão pela qual, o Reino Unido e os Estados Unidos dispensaram a exigência de um monitor independente em seus documentos.

A ação somente foi possível devido aos esforços conjuntos do Parquet National Financier francês, do Serious Fraud Office britânico e do Department of Justice norte-americano. “A Airbus se engajou em um esquema maciço de vários anos para melhorar de maneira corrupta seus interesses comerciais, pagando subornos na China e em outros países e ocultando esses subornos“, disse o procurador-geral assistente Brian A. Benczkowski, da Divisão Criminal do Departamento de Justiça (US DOJ).

Os promotores franceses também examinaram subornos para outros países, incluindo China, Japão, Rússia, Kuwait, Brasil e Turquia.

Os atos de corrupção eram administrados por uma unidade em sua sede na França, que seu ex-executivo-chefe Tom Enders teria chamado de “castelo de merda”.

Tal iniciativa resultou no desligamento de dezenas de altos executivos e na criação de um Painel Independente de Revisão de Compliance.

Para alívio da Airbus, a Boeing está em séria desvantagem após os 2 acidentes com seus aviões 737 Max, em 2018 e 2019. Em razão disso, a Boeing parou temporariamente de fabricar o avião 737 Max, seu jato de passageiros mais popular e perdeu pedidos de compra de 87 aviões comerciais.

Certamente, essa foi uma oportunidade de ouro para a Airbus voltar a se capitalizar.

LIÇÕES APRENDIDAS

  • Em negócios onde as transações são milionárias, é preciso estar presente algum representante da área de compliance ou controles internos. Em último caso, alguém de auditoria interna. O ideal seria um profissional de GRC (Governance, Risk and Compliance).
  • Houve falha não apenas no programa de compliance, mas também na área de controles internos, visto que ambos não foram capazes de detectar alguma irregularidade nos processos de compra de aeronaves, nos países onde se alegou ter havido corrupção, além da exportação de tecnologia bélica dos EUA, sem o cumprimento dos requisitos legais.
  • É preciso rever todo o processo de venda de aeronaves, para estabelecer os pontos de controle e as potenciais fragilidades.
  • É preciso rever todo o processo de transporte de produtos bélicos, não importando a origem e o destino.
  • Há necessidade de um monitoramento mais próximo a ser executado pelo Conselho de Administrado, liderado pelo chairman.

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