12.11.2023 – O avanço da tecnologia é avassalador e inevitável. Todavia, assim como a tecnologia revoluciona a comunicação em âmbito global, viabilizando o acesso fácil à informação e levando o progresso a locais antes inacessíveis, pode ter um efeito contrário, com um propósito escuso perpetrado por aquele que quer maliciosamente converter uma mentira em uma verdade. Aliás, como já propagava Joseph Goebbels, ministro da propaganda nazista, “uma mentira dita mil vezes torna-se verdade“.

Embora os mais céticos rebatam essa expressão, alegando que uma mentira dita mil vezes, continua sendo uma mentira dita mil vezes, é a mais pura verdade que as consequências da referida mentira podem ser desastrosas, como, por exemplo, em acusações multilaterais na esfera política brasileira e internacional e até mesmo, em âmbito privado com pessoas comuns, como no caso recente, divulgado na imprensa, em que alunos de uma escola manipularam fotos de colegas, colocando seus rostos em corpos nus e divulgando as fotos em redes sociais.

Parecem ser situações inócuas, mas não são. Basta ler, por exemplo, o artigo do jornal The Washington Post, no qual o mesmo divulga que um estudo indicou que fake news teriam sido decisivas na eleição em que o ex-presidente Donald Trump foi eleito nos EUA. Da mesma forma, retratando o caso ocorrido com as estudantes acima, o estrago psicológico já causado às adolescentes é devastador, a despeito de quaisquer explicações ou retratações acerca das falácias incutidas em tais fotos.

Essa semana o site Universo Online divulgou um interessante artigo de autoria do LupaMundi, que, segundo o artigo, resulta de um projeto com dois financiamentos, sendo um do International Center for Journalists (ICFJ) via Disarming Disinformation, programa financiado pelo Fundo Scripps Howard, e da International Fact-checking Network (IFCN), contando ainda com a checagem externa feita pela organização Latam Chequea, que tem como propósito o combate a fake news e à desinformação, com websites como Chequeado e Countering Disinformation. Aliás, o ICFJ possui uma página interessantíssima sobre a investigação da desinformação, trazendo inúmeras e importantes dicas para checar a veracidade de informações divulgadas publicamente.

O artigo trouxe informações realmente interessantes sobre um mapeamento feito em âmbito global a respeito do tema, iniciando-se por um mapa abaixo contemplando 5 categorias e 24 temas selecionados que já dão uma ideia de como a questão de fake news é encarada pelos países:

O estudo apontado abrangeu 188 países dos 195 países reconhecidos pela Organização das Nações Unidas (ONU) e identificou que apenas 35 países têm leis em vigor específicas sobre combate à desinformação, sendo a maior parte na Europa, ou seja, 28 deles ou 78% do conjunto. Aliás, mais uma vez, os países europeus beneficiaram-se de uma legislação sancionada no âmbito da União Europeia, em 2023, trazendo obrigações e responsabilização às plataformas de internet ao propagar potencialmente fake news: o Digital Services Act (DSA). Releva salientar que os 7 países restantes estão na África e na Ásia, merecendo os elogios da comunidade internacional pelo esforço local em conter a desinformação.

  1. ÁFRICA: (i) Etiópia e (ii) Mauritânia
  2. ÁSIA: (i) Cazaquistão, (ii) Singapura, (iii) Índia, (iv) Indonésia e (v) Paquistão

Dos 188 países pesquisados, 115 países, incluindo o Brasil, não possuem leis específicas para o combate a fake news e desinformação, sendo, por conseguinte, utilizadas outras leis utilizadas com esse propósito. É importante salientar que desses países, 47% acabam coibindo fake news por meio da utilização de seus respectivos códigos penais, ao apenar violações tificadas e causadas pelas fake news. No caso do Brasil, existe o projeto de lei (PL) 2630/2020, de autoria do Senador Alessandro Vieira, do Partido Cidadania no Estado de Sergipe, cujo propósito é a aprovação de uma lei ordinária com o propósito de combater especificamente fake news, embora sua atuação promova foco essencialmente nas esferas cível e administrativa.

Novamente, dos 188 países pesquisados, 38 países não possuem qualquer tipo de regulamentação a respeito do tema, seja de forma direta ou indireta, não havendo recursos legais para coibir potencialmente fake news. Na América do Sul, por exemplo, dos 11 países, 8 países se encontram nessa situação. Aliás, 7 países foram excluídos da pesquisa pela ausência de dados: (i) Islândia, (ii) Micronésia, (iii) Dominica, (iv) Niger, (v) Palau, (vi) Suriname e (vii) Antigua e Barbuda.

A questão poderia ter um desfecho simples, já que a propagação de uma mentira seria algo considerado moralmente errado por todos. Todavia, os críticos à regulação da matéria reiteram de forma ostensiva a questão da censura, alegando que o cidadão tem o direito constitucional de se manifestar, amparado na Constituição Brasileira pelo Artigo 5, IV que assevera que “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato” e pelo Artigo 5, XIV que assevera que “é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional“.

Outro aspecto crucial é como certificar se o assunto é verdadeiro ou se é uma fake news. Apesar de nem sempre ser tão fácil fazer essa distinção, é sugerida a leitura da página da ICFJ descrita acima. Indubitável, portanto, ser um tema complexo, pois, considerando a natureza da fake news, a velocidade com que ela viraliza e as consequências que ela produz, pode ocasionar um dano maior ou menor, específico a um indivíduo ou a um grupo de pessoas e pode ainda ser executada por um ou por múltiplos autores.

Além disso, existem fake news que são disseminadas em conteúdos pagos em plataformas na internet. É exatamente em razão desse ponto que houve a iniciativa da União Europeia para aprovar o Digital Services Act, já que buscou corresponsabilizar as plataformas que auferem renda, disseminando, sem filtros, fake news.

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