18.05.2020 – O Governo federal publicou a Medida Provisória 966, com apenas 4 artigos, em 13 de maio de 2020, que, nesses tempos de ferrenha tempestade política, causaram frisson junto à mídia, porque supostamente, estaria limitando a responsabilidade do agente público e propiciando mais um flanco para a impunidade.

Com a devida venia, convidaria a todos os críticos dessa Medida Provisória a sentar na cadeira de um gestor, que precisa tomar decisões, em uma situação de emergência, em razão dos efeitos nefastos causados pela pandemia da Covid-19 e assinar a compra de bens e serviços, com dispensa de licitação, para obras e serviços de engenharia até R$ 100.000,00 (cem mil reais) e para outros serviços e compras no valor de até R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), consoante disposto na Medida Provisória 961 de 06 de maio de 2020.

Segundo a mesma Medida Provisória 961, foi ainda autorizado o pagamento antecipado nas licitações e nos contratos pela Administração, desde que (i) representasse condição indispensável para obter o bem ou assegurar a prestação do serviço; ou (ii) propiciasse significativa economia de recursos, além de dever ser aplicado o Regime Diferenciado de Contratações Públicas – RDC, de que trata a Lei nº 12.462, de 4 de agosto de 2011, para licitações e contratações de quaisquer obras, serviços, compras, alienações e locações.

Ao longo dos últimos anos, empresas multinacionais sérias com presença no Brasil, caso viessem a ter qualquer tipo de interação com agentes públicos brasileiros, na contratação de algum serviço ou no suporte a algum evento, eram orientadas por suas áreas de compliance ou consultores externos a obter a autorização da chefia do agente público para levar a cabo tal interação. Porém, na prática, isso não ocorria… e não ocorria porque o gestor público nunca teve segurança jurídica na aprovação ou autorização de determinado ato, por mais honesto que fosse. Assim, se a autorização de chefia fosse pré-condição para interação do setor privado com o setor público no Brasil… ela dificilmente ocorreria.

Em 06 de maio de 2016, a Controladoria Geral da União – CGU e a Comissão de Ética Pública editaram a Orientação Normativa Conjunta 001/2016, almejando proporcionar a segurança jurídica e reforçar os princípios da Moralidade e da Transparência Pública, diante da interação do setor público com o setor privado. Recomendo a leitura de um artigo específico, para que se entenda melhor o alcance desse ato administrativo.

O fato é que fraude e corrupção ocorrem com dolo, com a intenção do agente público em lesar o erário, em razão de algum benefício de natureza pessoal.

E a Medida Provisória 966 refere-se à responsabilidade por ação ou omissão com dolo ou erro grosseiro. Apesar da polêmica causada pelo termo “erro grosseiro”, a Medida Provisória 966 o define como o erro manifesto, evidente e inescusável praticado com culpa grave, caracterizado por ação ou omissão com elevado grau de negligência, imprudência ou imperícia.

Ao contrário de interpretações díspares, parece-me clara a intenção do autor da Medida Provisória 966 em proporcionar o mínimo de segurança jurídica na tomada de decisão por partes de gestores públicos, pressionados pelo fator tempo, em razão da sua responsabilidade e da dependência de milhares de vidas em ter alguma chance contra o coronavirus.

A Medida Provisória 966 não livra o mau gestor que cometer qualquer ato de fraude ou corrupção ou sequer livra a responsabilidade daquele que ordenar a compra de bens com sobrevalor considerável ou daquele que contratar fornecedor de bens ou serviços que sequer possuem uma sede física, pois essas duas últimas situações se encaixam facilmente no conceito de “erro grosseiro”, por mais que o agente público queira argumentar o seu desconhecimento em relação às irregularidades, pois é o seu dever, apesar da pressão temporal, agir com o mínimo de probidade na aferição de valores de mercado e na diligência básica acerca de determinado fornecedor e de seus sócios.

Os agentes públicos que se valem da sua função para locupletarem-se ilicitamente à custa de vidas humanas, pois certamente fraude e corrupção matam um número incontável de pessoas que deixam de ter a assistência do Estado pela falta dos recursos desviados, devem não somente ressarcir o erário com todos os bens confiscados, mas também receberem penas exemplares.

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