
16.02.2023 – Ser preso no Brasil não é tarefa para amadores, ou seja, a lei processual brasileira, especialmente na esfera criminal, cria tantos mecanismos para adiamento do trânsito em julgado da decisão judicial (quando não mais cabe recurso de qualquer espécie), que aquele que possua recursos para contratar um advogado ou mesmo possa contar com um defensor público atuante, consegue procrastinar a decisão final, transitada em julgado, e, com isso, em muitos casos, alcançar a prescrição penal, embora a legislação esteja avançando a passos lentos para tentar tornar imprescritíveis delitos como feminicídio ou estupro.
A dificuldade para prender alguém começa respaldada por alguns direitos fundamentais listados no Art. 5º da Constituição Federal de 1988, especialmente o inciso LVI, com o seguinte texto:
Prender alguém se torna ainda mais complexo com o disposto no Art. 5º, LXI que dispõe o seguinte:
No Brasil, a lei brasileira permite a prisão de alguém em algumas circunstâncias como:
Prisão em flagrante | De acordo com o Art. 302 do Código de Processo Penal, uma pessoa está em flagrante delito quando está cometendo ou acaba de cometer a infração penal ou está sendo perseguido sob a presunção de ser suspeito da autoria ou participação no delito. |
Prisão temporária | Criada pela Lei 7.960/89, permite a decretação da prisão de alguém (i) quando imprescindível para as investigações do inquérito policial; (ii) quando o indicado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos necessários ao esclarecimento de sua identidade; e (iii) quando houver fundadas razões, de acordo com qualquer prova admitida na legislação penal, de autoria ou participação do indiciado nos seguintes crimes: a) homicídio doloso (art. 121, caput, e seu § 2°); b) seqüestro ou cárcere privado (art. 148, caput, e seus §§ 1° e 2°); c) roubo (art. 157, caput, e seus §§ 1°, 2° e 3°); d) extorsão (art. 158, caput, e seus §§ 1° e 2°); e) extorsão mediante seqüestro (art. 159, caput, e seus §§ 1°, 2° e 3°); f) estupro (art. 213, caput, e sua combinação com o art. 223, caput, e parágrafo único); g) atentado violento ao pudor (art. 214, caput, e sua combinação com o art. 223, caput, e parágrafo único); h) rapto violento (art. 219, e sua combinação com o art. 223 caput, e parágrafo único); i) epidemia com resultado de morte (art. 267, § 1°); j) envenenamento de água potável ou substância alimentícia ou medicinal qualificado pela morte (art. 270, caput, combinado com art. 285); l) quadrilha ou bando (art. 288), todos do Código Penal; m) genocídio (arts. 1°, 2° e 3° da Lei n° 2.889, de 1° de outubro de 1956), em qualquer de sua formas típicas; n) tráfico de drogas (art. 12 da Lei n° 6.368, de 21 de outubro de 1976); o) crimes contra o sistema financeiro (Lei n° 7.492, de 16 de junho de 1986) e p) crimes previstos na Lei de Terrorismo. |
Prisão preventiva | De acordo com o Art. 312 do Código de Processo Penal, a prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria e de perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado. |
Em 2019, entretanto, o deputado Alex Manente, do partido Cidadania de São Paulo, apresentou a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 199/19, com uma solução, no mínimo, peculiar. Ao invés de permitir a prisão de alguém após a condenação em segunda instância, pura e simplesmente, propôs a extinção do Recurso Especial para o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Recurso Extraordinário para o Supremo Tribunal Federal (STF) previstos nos Arts. 102 e 105 da Constituição Federal de 1988. Dessa forma, a condenação em segunda instância já transitaria em julgado, eis que não seria passível de recursos aos tribunais superiores. Assim, não haveria alteração de dispositivos do Art. 5º, que tratam dos direitos fundamentais do cidadão, sendo considerados cláusulas pétreas, não passíveis de alteração, se o propósito for de subtração ou redução dos direitos ali definidos.
Por outro lado, a referida PEC ainda permitiria ao réu apresentar ação revisional especial ou extraordinária ao STF e ao STJ, mas sem que tal prerrogativa impedisse o início do cumprimento da pena na prisão.
Mas definitivamente essa não foi a única iniciativa sobre o mesmo assunto e que não logrou êxito para alterar a Constituição Federal de 1988. O ex-Ministro Sérgio Moro e atualmente senador, promoveu o desarquivamento do Projeto de Lei do Senado (PLS) 166/18, oriundo de um desmembramento do pacote anticrime apresentado por ele, quando ocupava o cargo de Ministro da Justiça, durante o mandato do ex-presidente Jair Messias Bolsonaro e de autoria do Senador Lasier Martins do PSD do Rio Grande do Sul.
Ao contrário da PEC 199/19, esse PLS 166/18 sofreu duro ataque de alguns constitucionalistas, pois ele focou na alteração do Código de Processo Penal, permitindo a prisão já a partir da condenação em segunda instância; o que contrariaria os dispositivos constitucionais acima citados; sendo, portanto, inconstitucional.
Será, com efeito, um tema bastante polêmico que a sociedade brasileira assistirá aos debates nos próximos meses, em mais uma tentativa de reduzir a impunidade reinante na “terra brasilis”.
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