
29.04.2020 – Ontem, houve a oportunidade de estabelecer a narrativa histórica da sucessão de fatos que levou à falência da Enron em 2002, culminando no prejuízo de muitos acionistas, na perda de benefícios de milhares de empregados e na prisão de alguns executivos.
Com efeito, a empresa de auditoria Arthur Andersen, que era na época o ícone das empresas de auditoria em âmbito global foi arrastada a reboque com a falência da Enron.
O escândalo com a Enron foi a gota d’água para que o Senador Paul Sarbanes e o deputado Michael Oxley pudessem aprovar em 30 de julho de 2002, a Lei Sarbanes-Oxley, posteriormente apelidada de SOX. É importante salientar que o governo havia desregulamentado o setor de petróleo e gás para permitir mais concorrência, mas a desregulamentação também facilitou a ação fraudulenta das empresas. A Enron, entre outras empresas, aproveitou-se dessa situação.
“A legislação que elaboramos na conferência ajuda bastante na solução dos problemas flagrantes que surgiram como resultado de má conduta corporativa e escândalos contábeis. Não é uma resposta total, mas acho que fizemos um excelente progresso, e a Casa Branca me informou esta manhã que eles apoiam o acordo da conferência“
Michael Oxley, deputado norte-americano e um dos autores da Lei Sarbanes-Oxley
Dentre as fraudes notadas no caso Enron, destacavam-se relatórios de ganhos inflacionados para acionistas, desvios de fundos corporativos por executivos e manipulações ilegais do mercado de energia.
A SOX foi um marco importante no combate a fraudes empresariais e implementou reformas e acréscimos em quatro áreas principais:
- Responsabilidade corporativa
- Maior punição criminal
- Regulamento contábil
- Novas proteções
Dentro dessas quatro áreas, destacam-se as seguintes inovações trazidas pela SOX:
– Eliminação de brechas nas práticas contábeis. |
– Reforço das regras de governança corporativa. |
– Aumento dos requisitos de prestação de contas e divulgação de empresas, especialmente executivos e contadores e auditores públicos das empresas. |
– Aumento dos requisitos de transparência corporativa nos relatórios aos acionistas e descrições de transações financeiras. |
– Reforço das proteções aos denunciantes e monitoramento da conformidade. |
Aumento de multas por improbidade corporativa e executiva. |
Autorizar a criação do Conselho de Supervisão Contábil de Empresa Pública (PCAOB) para monitorar ainda mais o comportamento corporativo, especialmente na área de contabilidade. |
Considerando os fatos que ocorreram com a Enron e sua relação de interdependência com a Arthur Andersen, a SOX trouxe todo o título II com normas para garantir a independência da empresa de auditoria, objetivando mitigar ao máximo o potencial conflito de interesses existentes na relação da mesma com a empresa a ser auditada, destacando-se as seguintes limitações:
– Proibição de prestar quaisquer dos seguintes serviços, além da auditoria, desde 180 antes do início dos trabalhos de auditoria: (1) contabilidade ou outros serviços relacionados aos registros contábeis ou demonstrações financeiras do cliente de auditoria; (2) projeto e implementação de sistemas de informação financeira; (3) serviços de avaliação ou avaliação, opiniões justas ou relatórios de contribuições em espécie; (4) serviços atuariais; (5) serviços de terceirização de auditoria interna; (6) funções de gestão ou recursos humanos; (7) corretor ou negociante, consultor de investimentos ou serviços bancários de investimento; (8) serviços jurídicos e serviços especializados não relacionados à auditoria; e (9) qualquer outro serviço que o Conselho determine, por regulamento, é inadmissível. |
– Necessidade de rotatividade da empresa de auditoria, em razão da proibição do auditor ter prestado serviços de auditoria para aquela empresa nos últimos 5 anos. |
– Toda empresa deve ter um comitê de auditoria que deve pré-aprovar serviços de auditoria e de não auditoria prestados por uma empresa de auditoria, devendo ser dada ciência a investidores. |
– O Comitê de Auditoria da empresa deve ser avisado pela empresa de auditoria, a repeito de: (1) todas as políticas e práticas contábeis críticas a serem usadas; (2) todos os tratamentos alternativos de informações financeiras dentro dos princípios contábeis geralmente aceitos que foram discutidos com funcionários da administração da empresa, ramificações do uso de divulgações e tratamentos alternativos e o tratamento preferido pela empresa de auditoria; e (3) outras comunicações por escrito relevantes entre a empresa de auditoria e a administração da empresa, como qualquer carta de administração ou cronograma de diferenças não ajustadas. |
– O Comitê de Auditoria da empresa deve ser: (1) um comitê (ou órgão equivalente) estabelecido pelo conselho de administração da empresa com o objetivo de supervisionar os processos contábeis, os relatórios financeiros e as auditorias das demonstrações financeiras da empresa; e (2) se não existir um comitê, toda a diretoria da empresa. |
– Passou a ser ilegal para uma empresa de auditoria executar para uma empresa qualquer serviço de auditoria, se um diretor executivo, controlador, diretor financeiro, diretor contábil ou qualquer pessoa que ocupe uma posição equivalente para a empresa, foi empregado por essa empresa de auditoria e participou da auditoria dessa empresa durante o período de 1 ano anterior à data de início da auditoria. |
“Esse projeto fortalece a responsabilidade corporativa e a integridade do auditor, soluciona conflitos de interesse e protege funcionários, donos de pensão e investidores contra fraudes e enganos”
Paul Sarbanes – Senador norte-americano e um dos autores da Lei Sarbanes-Oxley
Após o advento da SOX, os executivos que conscientemente certificam demonstrações financeiras falsas, passaram a poder ser presos. Antes da SOX, era muito frequente os executivos alegarem em sua inocência o desconhecimento de alguma fraude dentro de sua organização.
Para as empresas em geral, as seguintes seções foram as mais relevantes, já que impuseram mudanças de suma importância:
Seção 302 – exige que os executivos corporativos seniores certifiquem pessoalmente por escrito que as demonstrações financeiras da empresa “cumprem os requisitos de divulgação da SEC e apresentam de maneira justa em todos os aspectos materiais as operações e condição financeira do emissor”. Os executivos que assinam declarações financeiras que sabem serem imprecisas estão sujeitos a penalidades criminais, incluindo penas de prisão. |
Seção 404 – exige que a gerência e os auditores estabeleçam controles internos e métodos de relatório para garantir a adequação desses controles. |
Seção 802 – contém as três regras que afetam a manutenção de registros. A primeira trata da destruição e falsificação de registros. A segunda define estritamente o período de retenção para armazenar registros. A terceira descreve os registros comerciais específicos que as empresas precisam armazenar, incluindo comunicações eletrônicas. |
É importante salientar que a SOX previu na Seção 806 uma proteção governamental de não retaliação para os empregados que denunciassem qualquer situação de fraude, permitindo inclusive o ajuizamento de ações civis públicas com esse fim.
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