
26.10.2020 – Recentemente, a imprensa noticiou duas situações que causaram estarrecimento aos brasileiros:
1. Um dos maiores traficantes do Brasil foi liberado por sua prisão preventiva não ter sido revisada a cada 90 dias. |
2. Um senador foi flagrado com R$ 33 mil na cueca, alegando em sua defesa que o dinheiro seria para pagar funcionários e pede afastamento pelo prazo de 90 dias. |
Ao se deparar com essas duas situações, nunca foi tão apropriado o jargão: – O Brasil não é para amadores!
E o que os dois casos possuem em comum? A ineficiência das leis no Brasil para combater o crime.
Esperar de um juiz de direito que o mesmo detenha o controle de revisões de prisões preventivas a cada 90 dias, não parece absolutamente razoável; afinal, o processo do preso pode estar em trâmite em um tribunal regional ou mesmo em um tribunal superior. O acréscimo de tal dispositivo ao código de processo penal cria mais uma brecha para ilidir o cumprimento da lei.
Aqueles profissionais que tem algum conhecimento sobre compliance sabem que o pesadelo desses profissionais é exercer o controle dos limites impostos nas políticas e procedimentos. Assim, políticas que, por exemplo, digam que funcionários da área comercial poderão ter somente 3 almoços com o mesmo cliente durante 1 ano calendário, ou ter 1 almoço mensal com qualquer cliente, criam um enorme desafio para que seja exercido o controle de tais limites, pois de nada adianta a regra, se não for exercido o respectivo controle para atestar o seu cumprimento. Aqui falamos do universo de uma empresa, que está restrito à sua quantidade de funcionários. Todavia, imaginar que os juízes criminais terão a infra-estrutura necessária para exercer esse controle, é desconhecer a realidade nacional ou simplesmente ignorá-la.
Quanto ao caso do “dinheiro na cueca”, é um clássico exemplo da inoperância das leis no Brasil.
Primeiramente, por garantir imunidade distinta dos demais cidadãos brasileiros.
Na verdade, a imunidade parlamentar inicia-se pela imunidade civil e penal, onde o parlamentar é imune no exercício de sua atividade legislativa, conforme previsto no Art. 53:
Art. 53. Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos.
Além disso a imunidade processual, a imunidade prisional e o foro especial por prerrogativa de função, todos previstos em parágrafos do mesmo artigo constitucional acima, complementam o pacote que blinda o parlamentar de responder por um ato ilícito, do mesmo modo como seria esperado de qualquer cidadão. Cabe, então, ao Conselho de Ética decidir o seu destino. Isso se o parlamentar não solicitar a sua licença, quando, então, fica sustada qualquer iniciativa nesse sentido.
Outro aspecto importante a merecer discussão é o fato do Brasil ter criado em sua Carta Magna de 1988 o único direito fundamental que não admite exceção: o direito de não ser torturado, previsto no Art. 5, III. Com efeito, não há que se criticar tal vedação, mas é preciso criar alternativas para a obtenção de provas que permitam elucidar a infindável quantidade de delitos que desponta todos os dias. A colaboração premiada, no caso de indivíduos e o acordo de leniência, no caso de empresas (ainda que o Brasil tenha perdido uma grande chance de criminalizar a pessoa jurídica em sua lei anticorrupção – Lei 12.846/2013), certamente foram iniciativas muito bem-vindas para colaborar com as autoridades na obtenção de provas.
Todavia, a confissão, que já se encontra disciplinada no Art. 65 do Código Penal, como circunstância atenuante e nos Arts. 197 a 200 do Código Penal, com instruções pertinentes a sua aplicabilidade, não é explorada no Brasil, como deveria. A comparação com a força que a confissão adquire em países como os Estados Unidos, por exemplo, demonstra o desperdício de um instrumento poderoso à disposição das autoridades. A atenuação da pena pela confissão, da forma como é aplicada no Brasil, torna muito pouco atraente a sua utilização por suspeitos, réus e suas respectivas defesas.
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