04.08.2022 – Em 01 de julho de 2021, foi sancionada a Lei 14.181, também chamada de Lei do Superendividamento, alterando o Código de Defesa do Consumidor e o Estatuto do Idoso, com o propósito de proteger os indivíduos que, de boa-fé, tivessem contraído dívidas acima da sua capacidade de pagamento e sem comprometer seu mínimo existencial, excetuando os consumidores de artigos de luxo, que não estariam cobertos por essa proteção.

Eis que em 27 de julho de 2022, foi publicado o Decreto 11.150, que regulamentou a lei supracitada, sendo que o referido decreto segue a mesma linha da lei, definindo superendividamento como a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial. São consideradas dívidas de consumo os compromissos financeiros assumidos pelo consumidor pessoa natural para a aquisição ou a utilização de produto ou serviço como destinatário final.

Porém, mais importante que a definição de dívidas de consumo, foi a definição de mínimo existencial, ou seja, a renda mensal do consumidor pessoa natural equivalente a vinte e cinco por cento do salário mínimo vigente na data de publicação do referido Decreto. Sem entrar na discussão do credor que teria direito ao seu crédito e o devedor de boa-fé, mas que foi imprudente, negligente ou imperito, foi interessante testemunhar a crença da autoridade de que vinte e cinco por cento do salário mínimo vigente seria capaz de prover a sobrevivência de alguém. E logo em seguida, uma outra medida bastante controvertida é aplicada, na medida em que os vinte e cinco por cento do salário mínimo não seguem o reajuste do salário mínimo, ou seja, se já é difícil sobreviver com vinte e cinco por cento do salário mínimo vigente, que dirá sobreviver com percentual menor diante de um salário mínimo reajustado.

Por conseguinte, a preservação do mínimo existencial, passa a ser feita tomando por base sua renda e o total de dívidas a pagar, a cada mês, sendo certo que o mínimo existencial não é protegido contra:

1. as dívidas e os limites de créditos não afetos ao consumo.
2. as parcelas das dívidas relativas a financiamento e refinanciamento imobiliário.
3. as parcelas das dívidas decorrentes de empréstimos e financiamentos com garantias reais.
4. as parcelas das dívidas decorrentes de contratos de crédito garantidos por meio de fiança ou com aval.
5. as parcelas das dívidas decorrentes de operações de crédito rural.
6. as parcelas das dívidas contratadas para o financiamento da atividade empreendedora ou produtiva, inclusive aquelas subsidiadas pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES.
7, as parcelas das dívidas anteriormente renegociadas na forma do disposto no Capítulo V (Cobrança de Dívidas) do Título III da Lei nº 8.078, de 1990.
8. as parcelas das dívidas de tributos e despesas condominiais vinculadas a imóveis e móveis de propriedade do consumidor.
9. as parcelas das dívidas decorrentes de operação de crédito consignado regido por lei específica.
10. as parcelas das dívidas decorrentes de operações de crédito com antecipação, desconto e cessão, inclusive fiduciária, de saldos financeiros, de créditos e de direitos constituídos ou a constituir, inclusive por meio de endosso ou empenho de títulos ou outros instrumentos representativos.
11. os limites de crédito não utilizados associados a conta de pagamento pós-paga.
12. os limites disponíveis não utilizados de cheque especial e de linhas de crédito pré-aprovadas.

Um aspecto interessante da regulamentação é que a proteção do mínimo existencial não será considerado impedimento para a concessão de operação de crédito que tenha como objetivo substituir outra operação ou operações anteriormente contratadas, desde que se preste a melhorar as condições do consumidor, na mesma ou em outras instituições financeiras, embora nesse último caso somente seja possível mediante a portabilidade do crédito a ser regulamentada pelo Conselho Monetário Nacional.

Finalmente, no âmbito da conciliação administrativa ou judicial das situações de superendividamento em dívidas de consumo, a repactuação preservará as garantias e as formas de pagamento originariamente pactuadas, excetuando-se as dívidas oriundas de contratos celebrados dolosamente sem o propósito de realizar pagamento, ainda que decorrentes de relações de consumo e as dívidas provenientes de contratos de crédito com garantia real, de financiamentos imobiliários e de crédito rural.

Convém salientar diante de todo o exposto que a questão da aferição da boa-fé do superendividado pode se tornar bastante difícil e complexa, sem evidências ou indícios que possam efetivamente demonstrá-la.

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